CRÍTICA | A queda de um império em “Os Olhos de Tammy Faye”

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Os Olhos de Tammy Faye (2021) é uma cinebiografia dramática dirigida Michael Showalter e escrito por Abe Sylvia. O filme é baseado no documentário homônimo que conta a história de Tammy Faye Baker, uma pastora e cantora gospel que, ao lado do seu marido Jim Baker, fundou a maior instituição religiosa dos EUA nas décadas de 1970 e 1980. Através do programa The PTL Club, na PTL Television Network, a emissora cristã fundada por eles, seu alcance chegou em todo o mundo para mais de 13 milhões de espectadores.

Ao contrário do documentário The Eyes of Tammy Faye (2000) que mostra todos os podres e polêmicas do casal que os levaram à falência e à prisão de Jim Baker por fraude, o filme de 2021 é superficial ao mostrar quem realmente foi Tammy Faye, a sua luta para se manter como líder em uma comunidade religiosa que claramente a desprezava porque ela era expansiva, desinibida e se vestia como ela bem queria. Além disso, o filme faz uma caricatura fofinha e divertida de quem é Jim Bakker e tudo o que ele representou na época e representa hoje.

A PLT era tão poderosa, que o candidato à presidência dos EUA pelo Partido Republicano queria o apoio da emissora para garantir sua eleição e Tammy Faye, junto de seu marido, usavam toda a sua doçura e poder de persuasão, “em nome de Deus”, para conseguir o que eles quisessem do seu público. Tem um certo momento que vemos que Tammy era pró-LGBTQIA+ e que suas falas sobre o amor de Jesus para essas pessoas incomodava muito os outros líderes da igreja, que a consideravam devassa. 

“Deus não fez nenhum lixo. (…) Não somos nós quem dizemos quem vai ou não para o inferno. Nosso trabalho é curar pessoas.” – Tammy Faye 

Por mais que Tammy fosse uma dondoca que se orgulhava de ter conquistado tudo o que conquistou em nome de Deus, no filme acreditamos que ela realmente amava e fazia por amor, que ela tinha fé e acreditava que o amor curaria e tornaria o mundo melhor. Pelo menos até o momento em que eles precisavam desesperadamente de dinheiro por conta das dívidas da emissora. 

E tudo cai por terra quando um escândalo sai de controle e as fraudes e acusações de abuso sexual de Jim Bakker vêm à tona, eles perdem tudo e Jim é preso. O conto de fadas de Tammy acabou. No filme, temos ela por inocente, mas será que ela era mesmo tão inocente assim? Eu duvido. Sempre que havia alguma crise, eles usavam o nome de Deus para pedir dinheiro aos fieis na TV e faturavam MUITO, já que igrejas eram isentas de imposto. Lembra a você alguma celebridade televangelista brasileira? Talvez. 

Apesar de superficial e romantizar a televangelização que ocorreu na década de 1970, o filme é extremamente bem produzido. Toda a ambientação, cabelo, maquiagem, preparo dos atores, é tudo espetacular e isso se reflete na sua indicação do Oscar na categoria Melhor Maquiagem e Penteados. O envelhecimento da Jessica Chastain e do Andrew Garfield é tão natural e feito tão bem, que facilmente poderia ser uma viagem no tempo (risos). Eles ficaram tão parecidos com a Tammy e o Jim reais, que chega a ser assustador.  Se fosse um filme de ficção mudando o nome dos personagens, com certeza o filme seria perfeito. A maior falha dele é dizer ser uma cinebiografia sem abordar as reais polêmicas sexuais, políticas e religiosas de ambos. 

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Falando em Oscar, as atuações impecáveis dos protagonistas Jessica Chastain e Andrew Garfield. Jessica incorporou todos os trejeitos, a risada, até a voz de Betty Boop da Tammy. Um trabalho verdadeiramente impecável que a rendeu uma indicação de Melhor Atriz no Oscar. Apesar da minha favorita ser a Olivia Colman por A Filha Perdida, Jessica Chastain com certeza deu o que falar, já que o filme se sustenta quase que inteiramente nela. 

E o Andrew, bem, ele está muito convincente no seu papel de Pastor Bakker. Quem já foi a algum culto religioso sabe o quanto pastores, padres ou qualquer líder pregador, possuem um anto poder de persuasão, aquela fala mansa e olhos brilhantes para fazer você acreditar que apenas o jeito dele é o certo, o que te garantirá a salvação eterna no amor de Jesus (insira qualquer outra entidade de outras religiões aqui). E o Andrew consegue passar tudo isso de uma forma até assustadora, por mais que ele seja mais uma caricatura fofinha do verdadeiro Pastor Bakker, que ainda está vivo e falando abobrinha na TV. Recentemente, ele foi mais uma vez condenado por fake news sobre a Covid-19 e por vender tratamento milagroso. 

Para concluir, Os Olhos de Tammy Faye vende um bom filme de drama e humor, mas falha na tentativa de uma cinebiografia que tenta limpar a imagem tardiamente de uma celebridade tão interessante (bem ou mal), que foi a Tammy Faye em vida. Ela usou seu alcance para dar voz e espaço para assuntos importantes, mesmo indo contra os princípios da sua religião e dedicou o resto de sua vida a acolher e lutar pela causa LGBTQIA+, pregando o amor de Deus para todos.

Os Olhos de Tammy Faye ainda não está disponível em nenhum streaming no Brasil, mas em breve deve chegar no catálogo do Star+.

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NOTA: 2,8/5

5/5 – (1 vote)

Autor do Post:

Jéssica Rodrigues

administrator

Tropical darkzera, fã de filmes de horror, gateira, engenheira florestal, doutora em Crepúsculo e especialista em Cassandra Clare. Viajei por Idris, Forks, conheci Craigh na Dun e me diverti muito no Festival Midsommar.

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