Essa crítica pode conter alguns spoilers
A versão brasileira do longa argentino 4×4, traz à luz da trama um tópico muito atual e sensível à nossa sociedade atual. Com a direção de João Wainer e roteiro de Mariano Cohn e Gastón Duprat, A Jaula explora um jogo psicológico de gato e rato entre um ladrão e um rico médico.
Na trama, Djamlda (Chay Sude) entra em um carro de luxo afim de roubar o que puder de dentro do veículo, mas quando está prestes a sair, o ladrão percebe que foi trancado dentro do automóvel e não vai conseguir sair facilmente. O que ele não percebeu é que caiu na armadilha de um rico médico (Alexandre Nero) que estava planejando a armadilha há tempos, já que ele foi o alvo de vários roubos e decidiu vingar-se. O filme levanta a questão é: Quem é o vilão e quem é a vítima?
O filme logo começa com referências claras a mídia atual, com apresentadores sensacionalistas e indignados com o atual cenário do país. Apenas nesse comecinho do longa que ele reserva uma pitada de humor ácido dentro da trama, seja na televisão ou nas atitudes de “malandro” de Suede ao roubar o carro. No entanto, isso logo se transforma e toma uma proporção absurda de tensão e desespero sem mesmo o ator dizer uma palavra por longos minutos.
Fica claro que é graças a performance de Suede que é instaurado uma sensação claustrofóbica e aterrorizante que se prolonga por longos e agonizantes minutos do filme. Em A Jaula, a performance corporal se torna mais relevante do que o texto propriamente dito, e isso Suede faz com excelência, mesmo com o exagero e o extra, isso aumenta a intensidade do problema em que se encontra.
Já Nero se faz presente por áudio, nos guiando em um tormento psicológico e criando um personagem bastante conhecido por nós hoje em dia. Através de sua voz, quase que uma narração aterrorizante, que nos questiona a todo instante o que faríamos se tivéssemos a chance de nos vingar pelas injustiças de nossa vida. O seu personagem acaba por se tornar uma crítica a uma parcela da sociedade que se acha o julgador, júri e executor de uma pena torturante que ele julga ser correta. O cidadão de bem que vira aquilo que ele prega abominar: um criminoso.
O mais interessante na trama é como ele aborda dois polos opostos de uma sociedade fragilizada, o que em seu limite de tempo o torna complexo, ainda que não tenha explorado mais da história de Djalma. Ambos contém elementos negativos e pesados dentro de sua ótica, a narrativa pode até conduzir para algum sentimento raivoso a respeito do protagonista Djalma, mostrando suas vontades, crimes, alimentando um sentimento amargo no espectador. No entanto, a proporção que o filme alcance com a tortura do médico fica exorbitante, mesmo com todas as suas justificativas, é evidente a desproporcionalidade de suas ações, ele jamais quis fazer justiça, ele procurava vingança.
Se isso não ficou claro no decorrer do filme, o papel da polícia ao fim deixa isso de forma bastante óbvia para a audiência. Ao fim, após uma dose de tensão extra, o jornal narra os acontecimentos colocando a cereja no topo do bolo. Deixando evidente como a sociedade protege os mais privilegiados, somente um é chamado de criminoso e adivinha? Não é o médico.
Talvez o maior erro do filme seja seu final apressado, sem tempo para deixar a audiência respirar e digerir todas as surpresas que a trama joga na cara do espectador, tudo é feito como se o tempo estivesse acabando. Rápido, atropelado e um tanto desesperado para encerrar uma história que começou muito bem mas que acabou do nada.
E por fim, A Jaula deixa claro que o seu nome não se dá pela prisão que o carro de luxo se torna e sim pelo sistema que nos encontramos. Um sistema falho que não visa acabar com a criminalidade e sim fazer justiça com as próprias mãos, como é evidenciado ao longo do filme em diversas situações. Bem como a mesma jaula em que aprisionamos determinadas classes sociais, protegendo ou recriminando.
A Jaula estreia nos cinemas brasileiros no dia 17 de fevereiro.
Nota: 4/5
Autor do Post:
Ludmilla Maia
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25 anos. Criadora e uma das fundadoras da Tribernna, escrevo pra internet desde 2016. Amo podcast como amo cultura asiática e heróis. Nas horas vagas, concurseira e bacharel em direito.
Um dia eu te conto o que significa o nome “Tribernna”.