O crime que chocou o país em 2012 ganhou um documentário de 4 episódios na Netflix. “Elize Matsunaga: Era uma Vez um Crime” retrata a história do crime cometido pela Elize ao assassinar e esquartejar o seu marido, presidente da Yoki, Marcos Matsunaga.
Ao contrário da maioria dos documentários criminais, aqui a narrativa não é construída restritamente com base a documentos ou depoimentos judiciais. A própria autora do crime, Elize, que dita o rumo e a narrativa principal do documentário. Isso causa a princípio uma estranheza já que torna o documentário propenso a convencer o público da tese de defesa e não evidenciar os fatos de forma imparcial, de modo com que somente a audiência tire as devidas conclusões.
Como a tese de defesa de Elize em seu julgamento, o documentário tenta humanizá-la ao máximo, fazendo com que seu crime – de matar e esquartejar seu marido – seja menos repulsivo do que é (isso é impossível!). Em determinado episódios vemos o passado triste da paranaense, o que ela viveu em sua infância e o que teve que fazer em sua vida adulta para sobreviver. Além disso, o documentário ainda tenta justificar tal crime com as atitudes de Marcos, que (de acordo com a história) era um homem abusivo e violento.
Ainda que a construção da narrativa seja convincente, em seus termos técnicos e na própria história em si, ela se perde em momentos bem singulares. Como nas vezes que a Elize ao fazer seu depoimento para a Netflix sorri em momentos tensos, como ao falar da arma que matou seu marido, caindo por terra toda dinâmica que haviam criado dela, de uma moça sofrida e que havia feito algo por estado de necessidade. Em diversos momentos, eu em particular senti medo dela.

No entanto, o ponto extremamente positivo que foi feito através da escolha de vermos mais do lado da mulher da história foi as reflexões que o documentário promove, principalmente próximo do fim. Sobre como o julgamento de mulheres sofrem um peso maior do que a de homens, e de como todo crime em si foi julgado de forma diferente por causa do poder econômico da vítima. Além de, é claro, como a defesa pode ser horrível em desenterrar o passado de alguém para justificar o crime pelo qual foi vítima, como isso é inaceitável independente do gênero (por mais que seja mais comum quando a vítima é mulher).
Apesar de ter uma narrativa um tanto quanto tendenciosa, este nem é o maior defeito do documentário, porque é interessante ver outro ponto de vista, se você acompanhou o caso em tempo real e só via basicamente o que a acusação queria que nós víssemos.
O maior defeito do documentário foi a seleção de convidados e a forma como foi contada a história. Apesar de ser algo de conhecimento geral, e algo relativamente recente, seria interessante a narrativa criar elementos surpresas e contar a história como se montasse um quebra cabeça, junto com o julgamento. No entanto, não é isso que acontece. Infelizmente parece que tudo é jogado para o público, deixando diversos pontos da história sem explicação, nem fazem questão de comentar sobre e o julgamento em si nem é abordado em toda sua plenitude.
Algumas pessoas, principalmente para falar de Marcos, foram extremamente desnecessárias na construção da história, já que uma assume que não via há anos, não convivia dentro de sua casa e não poderia falar nada com real certeza, somente deduzia com base no que ele era na frente de várias pessoas (e sabemos que muitas pessoas agem de formas distintas dependendo do ambiente), e a outra pessoa era simplesmente alguém esporádico que só promoveu comentários machistas e preconceituosos. Na verdade, nenhuma das partes relacionadas ao Marcos foram essenciais, com exceção de um advogado. Isso tudo é mais um ponto a favor para a narrativa criada pela defesa, que tinha mais peso e mais pessoas para falar com propriedade sobre os fatos.

A melhor adição ao documentário foi sem dúvida os jornalistas, que derem posicionamentos e explicações de modo plausível, compreensível e que promovesse reflexões quanto a situação em si.
“Elize Matsunaga: Era uma Vez um Crime” cria uma narrativa tendenciosa, não promove um documentário que seja majoritariamente com base nos fatos e sim em depoimentos e teorias. Tenta trazer um paralelo entre defesa e acusação, mas falha. Não cria um caminho impactante e é monótona por diversas vezes, sendo desnecessária a quantidade de episódios e podendo ser resumida a um filme de 1h30m.
Nota: 2,8/5
Autor do Post:
Ludmilla Maia
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25 anos. Criadora e uma das fundadoras da Tribernna, escrevo pra internet desde 2016. Amo podcast como amo cultura asiática e heróis. Nas horas vagas, concurseira e bacharel em direito.
Um dia eu te conto o que significa o nome “Tribernna”.